O Governo português deu um passo decisivo no que toca à regulação do Alojamento Local (AL), ao aprovar um decreto-lei que modifica a dinâmica de poder entre condóminos e proprietários de unidades de AL. De acordo com a proposta legislativa, “no caso de a atividade de alojamento local ser exercida numa fração autónoma de edifício, ou parte de prédio suscetível de utilização independente, a assembleia de condóminos pode opor-se ao exercício da atividade de alojamento local na referida fração, através de deliberação fundamentada e aprovada por mais de metade da permilagem do edifício, com fundamento na prática reiterada e comprovada de atos que perturbem a normal utilização do prédio, bem como de atos que causem incómodo e afetem o descanso dos condóminos, solicitando, para o efeito, uma decisão do presidente da câmara municipal territorialmente competente que, por sua vez, em alternativa ao cancelamento imediato do registo do estabelecimento de AL, pode convidar as partes a obterem um acordo”, detalha o gabinete do ministro Miguel Pinto Luz.

Este novo regime, que emerge após a consulta com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP) e as regiões autónomas, representa uma mudança significativa na forma como os condomínios podem influenciar a presença de unidades de AL nos edifícios destinados a habitação.

O Que Muda?

Até agora, a legislação permitia que dois terços da permilagem de um condomínio decidissem o encerramento de uma unidade de Alojamento Local, forçando a sua saída do imóvel no prazo de 60 dias. Esta regra dava aos condóminos um poder considerável para decidir o destino de unidades de AL em prédios habitacionais, especialmente em áreas onde o turismo e o AL têm gerado conflitos entre residentes permanentes e os proprietários que exploram este tipo de negócio.

Com a nova legislação, esse poder é reduzido. Agora, enquanto mais de metade da permilagem do condomínio ainda pode solicitar o encerramento de uma unidade de AL, a decisão final caberá à autarquia. Este processo será mediado por um provedor designado pelo município, que terá a função de gerir os diferendos entre condóminos e proprietários de AL, garantindo um processo mais equilibrado e menos suscetível a decisões unilaterais.

Eliminação da Necessidade de Aprovação Unânime dos Condóminos

Uma das mudanças mais significativas introduzidas por este decreto-lei é a eliminação da necessidade de aprovação unânime dos condóminos para a abertura de novas unidades de AL em prédios destinados a habitação. Até agora, qualquer proprietário que desejasse converter uma fração de um prédio em regime de propriedade horizontal para Alojamento Local precisava da aprovação unânime do condomínio. Esta exigência foi vista como uma barreira significativa para novos investimentos em AL, especialmente em áreas urbanas onde os imóveis são muitas vezes partilhados por vários proprietários.

Com o novo diploma, os proprietários poderão iniciar a atividade de AL em frações habitacionais sem precisar da aprovação prévia dos outros condóminos ou de alterar o uso no título constitutivo do prédio. Isto representa uma liberalização importante para o setor, permitindo uma maior flexibilidade e facilidade na implementação de novas unidades de AL.

O Papel das Autarquias: A Nova Autoridade Decisória

Ao devolver às autarquias a decisão final sobre o encerramento das unidades de AL, o Governo aposta na "descentralização da regulamentação" e na criação de um equilíbrio mais justo entre os interesses dos investidores em AL e os residentes dos prédios. Esta medida também responde às críticas dirigidas ao anterior governo, que muitos consideravam ter dado demasiado poder aos condomínios, criando conflitos e limitando o desenvolvimento do AL em determinadas áreas.

As autarquias, com a possível introdução de um "provedor de alojamento local", terão agora um papel central na mediação de disputas, garantindo que as decisões sejam tomadas com base num processo negocial e não apenas na vontade da maioria dos condóminos. Se, no fim deste processo, o município decidir pelo encerramento de uma unidade de AL, esta ficará encerrada por um período de cinco anos, assegurando assim um intervalo substancial antes que a atividade possa ser retomada.

Implicações para o Setor do Alojamento Local

Estas mudanças legislativas prometem ter um impacto profundo no setor do Alojamento Local. Para os investidores e proprietários, a flexibilização das regras significa novas oportunidades e menos obstáculos burocráticos. Por outro lado, para os residentes de prédios habitacionais, a mudança pode ser vista com alguma preocupação, já que a capacidade de influenciar a presença de AL no seu prédio foi significativamente reduzida.

Esta nova abordagem do Governo parece procurar um equilíbrio entre a promoção do setor do Alojamento Local, que tem sido uma peça-chave no turismo português, e a proteção dos direitos dos residentes que convivem com este tipo de atividade nos seus prédios.

O que se pode Concluir?

O decreto-lei recentemente aprovado marca uma viragem na gestão do Alojamento Local em Portugal, redistribuindo poderes entre condóminos, proprietários e autarquias. Ao remover a necessidade de aprovação unânime dos condóminos para a instalação de unidades de AL e ao colocar a decisão final de encerramento nas mãos dos municípios, o Governo está a tentar criar um ambiente mais propício para o crescimento do AL, enquanto tenta mitigar os conflitos locais.

Esta nova legislação poderá trazer mais dinamismo ao setor, mas também exigirá uma maior atenção por parte das autarquias para gerir os potenciais conflitos que possam surgir. Para os condóminos, a alteração representa uma diminuição do seu poder, mas também pode significar uma nova forma de resolver disputas, com a mediação de entidades municipais. Resta saber como estas mudanças serão recebidas por todos os intervenientes e como irão influenciar o mercado de Alojamento Local nos próximos anos.